As novelas fazem parte da vida dos brasileiros desde antes da chegada da televisão. Veja como usar o repertório delas nas redações para o ENEM.
Há quase 60 anos, foi ao ar a primeira telenovela nacional, “Sua vida me pertence”, veiculada na TV Tupi de São Paulo. De lá para cá, as novelas fazem parte da vida da população e estão sempre no centro de muitas conversas. Elas geram debates, ditam a moda de roupas, linguagem, nomes próprios e até mesmo ajudam a mudar costumes da sociedade.
De acordo com estudos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), as novelas foram responsáveis pela queda da taxa de fertilidade e pelo aumento de divórcios no país. Isso porque, na telinha, as famílias mais bem-sucedidas e felizes costumam ser aquelas em que há poucos filhos. Da mesma forma, as separações de casais, quando um casamento não está mais dando certo, deixaram de ser um tabu.
Com o passar do tempo, as novelas envolveram cada vez mais o público tratando de questões alternativas. Entre elas, podemos citar as formas de preconceito e exclusão, criminalidade, imigração, política etc. Além disso, são importantes fontes de informação, pois, pouco a pouco, incluíram temas ligados à atualidade em suas tramas. Assim, mesmo a parcela da população que não tinha condições de ler livros ou jornais passou a se atualizar via novelas. Isso acontece porque elas possuem uma linguagem acessível a todos os públicos.
Portanto, as novelas são ótimas referências para qualquer bate-papo, e podem ser usadas até mesmo na sua redação para demonstrar repertório sociocultural produtivo. Para além das disputas amorosas entre mocinhos e vilões, a maioria das produções tem como pano de fundo assuntos relevantes e que merecem ser discutidos por todos nós. Vamos relembrar algumas novelas e conhecer como elas podem nos ser úteis em nossos textos?
“Amor de mãe”: tráfico infantil, riscos ao meio ambiente e crise no sistema educacional
Atualmente suspensa por causa da pandemia de coronavírus, a novela “Amor de mãe”, escrita por Manuela Dias, traz diversas questões que podem ser abordadas em redações. A trama principal gira em torno do tráfico de crianças. Lurdes, uma das protagonistas, teve um dos filhos vendido pelo próprio marido a uma traficante, no Nordeste. Ao descobrir que ele havia sido levado ao Rio de Janeiro, ela parte com seus outros filhos para a Cidade Maravilhosa a fim de tentar encontrá-lo.
Em 2019, um relatório da ONU mostrou que o tráfico de pessoas tem aumentado em todo o mundo. Em geral, a exploração sexual é a principal causa desse crime, como mostrado em outra novela, “Salve Jorge” (2012). Nela, a personagem Morena foi vítima do tráfico de mulheres, sendo levada à Turquia. Do total de indivíduos traficados, as crianças representam 30%. Algumas são levadas a trabalhos forçados ou outras formas de exploração. Embora não seja o caso de Domenico (filho de Lurdes), a história nos relembra uma situação que era muito comum no Brasil de 20 e poucos anos atrás.
A miséria de muitas cidades nordestinas e a falta do básico para viver já levou muitas famílias a serem persuadidas a vender suas crianças. Isso não era apenas um meio de subsistência, mas uma tentativa de garantir uma vida melhor a elas. Assim, a falta de perspectivas, a escassez de suprimentos e de educação fez com que inescrupulosos aproveitassem para lucrar. Esse exemplo pode ser usado em propostas que versam sobre exploração e tráfico humano, e também sobre adoção.
E ainda tem mais…
Entre as subtramas da novela, podemos lançar mão da discussão acerca das questões ambientais versus a ganância de alguns empresários. Uma grande indústria de plásticos polui a Baía de Guanabara e é constantemente combatida por uma ONG. Essa organização tenta proteger os recursos naturais e ensinar a importância da reciclagem para a população jovem da região, por meio da instituição escolar (qualquer semelhança com uma proposta de intervenção não é mera coincidência!).
Além disso, a própria questão educacional tratada na novela pode ser utilizada como um bom exemplo em seu texto. A escola da comunidade possui pouca infraestrutura e isso é justificado por sua localização – região com altos índices de criminalidade. Os alunos aparecem desmotivados e possuem suas próprias dificuldades para se manterem estudando. Um exemplo é a aluna com filha pequena que não consegue assistir às aulas. Isso pode ser uma forma de abordar a evasão escolar e a gravidez na adolescência.
Além disso, a escola foi alvo de tiroteio e ameaçada de fechamento (aqui foi feita uma alusão às “ocupações” de alguns anos atrás). A única grande defensora do ensino público é uma professora recém-formada, Camila. Essa personagem também foi importante quando se formou e contou como o preconceito racial dificulta o ingresso no ensino superior. Assim, trouxe à tona o debate sobre racismo e ações afirmativas, que podem ser abordados em vários tipos de propostas de redação.
“A força do querer” e a transexualidade
Voltando ao ar nesta semana, a novela “A força do querer” (2017) tratou a questão da transexualidade pela personagem Ivana. A questão é extremamente pertinente porque o Brasil lidera o ranking como o país que mais mata transexuais no mundo. Ao longo dos capítulos, é mostrado como a personagem, gradativamente, se assume e todas as dificuldades do caminho, desde a não aceitação de algumas pessoas da família até a conclusão da transição de gênero.
Temáticas ligadas às minorias, em especial às questões relativas à sexualidade, podem aparecer em diversas propostas, até mesmo naquelas mais subjetivas. Elas também são frequentes nas novelas, mesmo que em algumas delas personagens LGBTQI+ sejam estereotipadas. É importante ter clara a noção de direitos humanos e da sua importância, bem como conhecer a legislação vigente. Em junho de 2020, completou um ano da criminalização da homofobia e da transfobia pelo Supremo Tribunal Federal. Relacionar esses elementos pode ser uma forma de tratar o assunto na redação.
“Órfãos da Terra”: o Brasil como refúgio
Ao longo das décadas, diversas novelas trataram da questão migratória no país, principalmente relacionada à vinda dos europeus (em especial italianos), mas também indianos, japoneses e outras nacionalidades para cá. Assim, não foram poucas as tramas que envolveram diferentes sotaques e costumes, mostrando um Brasil que nem sempre conhecemos. Portanto, além de mostrar toda essa diversidade, as novelas que exploram esse segmento também executam um importante papel social.
Em 2019, foi ao ar um enredo que tratou de uma problemática recente em todo o mundo: a situação dos refugiados. “Órfãos da Terra” abordou as dificuldades de inclusão e socialização desse grupo, intercalando situações fictícias com depoimentos reais. Nela, vimos a fuga de uma família síria após a sua casa ser bombardeada. Com um bote, tentam chegar até a Grécia para, de lá, pegar um navio para o Brasil. Assim, a cena em que o bote naufraga rememora fatos de 2015, auge da guerra na Síria. Pessoas fugindo em botes era uma imagem recorrente no noticiário e muitas perderam a vida buscando um lugar pacífico para viver.
Hoje, cerca de 43 mil refugiados vivem no Brasil, quase 90% vindos da Venezuela, conforme o CONARE (Comitê Nacional para os Refugiados). No mundo, estima-se que o número de refugiados dobrou na última década. Entre as causas que levam ao deslocamento dessas pessoas estão conflitos, perseguições ou violência generalizada. Do total, mais da metade são crianças. A Síria é o país que mais tem refugiados espalhados pelo mundo.
E você, curte assistir novelas? Comente neste post sobre quais novelas têm feito você refletir!