Como começar uma redação exige muito mais do que apenas escolher palavras: é necessário apresentar um problema real, fundamentado em dados e com clareza crítica. No contexto do ENEM e dos vestibulares, introduções bem estruturadas são decisivas para alcançar notas altas, já que revelam o domínio do candidato sobre repertórios consistentes e a capacidade de análise.
Entre os temas possíveis, destaca-se a invisibilidade social das doenças crônicas e seus impactos na saúde pública brasileira. Esse assunto dialoga diretamente com a realidade do Sistema Único de Saúde (SUS), com as políticas públicas de prevenção e com as desigualdades sociais do país.
A seguir, você encontra textos motivadores oficiais que podem ser utilizados em uma proposta de redação sobre o tema. Eles fornecem dados, contextos e reflexões necessárias para desenvolver uma argumentação sólida.
Textos motivadores sobre a invisibilidade social das doenças crônicas
Texto I – Como a nova lei de 2025 contribui para dar visibilidade às doenças crônicas?
Em julho de 2025, foi sancionada uma norma que institui um programa nacional voltado às pessoas acometidas por fibromialgia, fadiga crônica, síndrome complexa de dor regional e doenças correlatas. Essa medida prevê ações no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), como atendimento multidisciplinar, capacitação de profissionais, incentivo à pesquisa e disseminação de informações sobre essas condições.
Entretanto, apesar desse avanço legal, especialistas ressaltam que ainda existe grande invisibilidade social e institucional em relação às doenças crônicas de dor. Pacientes, nesse contexto, frequentemente enfrentam estigma, demora no diagnóstico, falta de profissionais capacitados e dificuldades de inserção no mercado de trabalho. Além disso, em alguns casos, essas enfermidades podem ser equiparadas a deficiência, mas essa avaliação depende de regulamentação específica.

Fonte: Agência Senado. Disponível em: senado.leg.br
Texto II – De que forma a vulnerabilidade social agrava as doenças crônicas no Brasil?
Estudos recentes mostram que a vulnerabilidade social aumenta os riscos de desenvolvimento e agravamento das doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs), como diabetes, doenças cardiovasculares, respiratórias e síndromes de dor crônica. Isso ocorre porque condições de baixa renda, habitação precária, desemprego e acesso limitado a serviços de saúde e educação estão diretamente associadas à piora da saúde dessas populações.
Nesse cenário, a gestão em saúde e as políticas públicas assumem papel essencial, já que podem criar estratégias acessíveis de prevenção, diagnóstico e tratamento, garantindo maior equidade no acesso a serviços e informações. Ademais, políticas que promovam alimentação saudável, prática de atividade física e redução do consumo de tabaco e álcool são fundamentais para diminuir as desigualdades de saúde no país.
Fonte: Silva, A. F. R. et al. “Vulnerabilidade social e doenças crônicas não transmissíveis: o papel da gestão e das políticas em saúde”. Revista Contemporânea, v.3, n.10, 2023. DOI: 10.56083/RCV3N10-106
Texto III – Por que as doenças crônicas continuam crescendo e permanecem invisíveis?
O número de pessoas acometidas por doenças crônicas cresce no Brasil e no mundo. Essas condições, de progressão lenta e longa duração, podem ser transmissíveis (como a aids) ou não transmissíveis (como diabetes, hipertensão, lúpus, Alzheimer e fibromialgia).
Atualmente, cerca de 57 milhões de brasileiros vivem com ao menos uma doença crônica. No entanto, muitas delas só são diagnosticadas em estágios avançados, quando os efeitos já são irreversíveis, o que reforça a importância da detecção precoce e do acompanhamento médico contínuo.
No caso da fibromialgia, por exemplo, a dor difusa, a fadiga e os distúrbios do sono impactam intensamente a vida dos pacientes, ainda que a doença permaneça invisível aos olhos de grande parte da sociedade. Já o Alzheimer, que está entre as dez principais causas de morte no mundo, compromete progressivamente as funções cognitivas, afetando não apenas os pacientes, mas também suas famílias e cuidadores.
Portanto, ainda que não haja cura para a maioria dessas doenças, tratamentos multidisciplinares, políticas públicas eficazes e práticas de autocuidado (alimentação equilibrada, atividade física e acompanhamento especializado) podem reduzir complicações e melhorar a qualidade de vida.
Fonte: Blog Sabin. Disponível em: sabin.com.br
Texto IV – O que os dados da OPAS revelam sobre as doenças crônicas nas Américas?
Um relatório da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), publicado em 2024, mostra que as doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs) continuam sendo a principal causa de morte e incapacidade nas Américas. Entre 2000 e 2019, o número total de mortes na região aumentou em 31%, crescimento mais alto que em qualquer outra região da Organização Mundial da Saúde (OMS).
De acordo com o documento, as DCNTs — como doenças cardiovasculares, câncer, diabetes, doenças respiratórias, transtornos mentais e condições neurológicas — responderam por 90% das mortes na região em 2019. O envelhecimento populacional é apontado como um dos principais fatores para o aumento dos casos, o que exige sistemas de saúde mais preparados para lidar com uma população que vive mais, mas também convive com maior carga de doenças.
Além disso, o relatório destaca desigualdades regionais e de gênero. No Caribe Latino, por exemplo, a taxa de mortalidade por DCNT é 1,5 vez maior que na sub-região andina. Enquanto os homens sofrem mais com doenças cardiovasculares e uso de álcool, as mulheres apresentam maiores índices de ansiedade, depressão e violência por parceiro íntimo.
Assim, para a OPAS, enfrentar o problema exige intervenções comprovadas de prevenção, como a redução de fatores de risco ligados ao estilo de vida, além do fortalecimento da atenção primária em saúde e da criação de políticas públicas que preparem os sistemas nacionais para o desafio das DCNT em sociedades em rápido envelhecimento.
Fonte: OPAS. Disponível em: paho.org
Argumentos para a redação sobre doenças crônicas
Argumento 1 – A naturalização da invisibilidade social das doenças crônicas
Causa:
Historicamente, o Brasil consolidou uma cultura que prioriza doenças de maior visibilidade imediata, como epidemias e emergências sanitárias, em detrimento das doenças crônicas, de longa duração e progressão lenta. Isso resulta em demora nos diagnósticos, estigmatização social e falta de políticas públicas específicas.
Consequência:
Esse cenário gera exclusão social e institucional dos pacientes, que sofrem com falta de acesso a tratamentos especializados, dificuldades de inserção no mercado de trabalho e estigmas que fragilizam sua autoestima. Além disso, a invisibilidade contribui para o aumento da sobrecarga no SUS, já que diagnósticos tardios implicam custos mais altos e menor eficácia terapêutica.
Repertório que comprova:
A filósofa Simone de Beauvoir, em A Velhice, analisa como sociedades modernas tendem a negar ou invisibilizar processos que fogem ao ideal de produtividade e juventude. Esse pensamento pode ser aplicado ao contexto das doenças crônicas, pois tais condições, ao não se encaixarem em narrativas de utilidade social imediata, acabam sendo marginalizadas.
Solução possível:
Campanhas nacionais de conscientização e desestigmatização das doenças crônicas, aliadas a programas de formação continuada de profissionais de saúde, podem ampliar a visibilidade social dessas condições. Além disso, políticas públicas que fortaleçam o diagnóstico precoce e o acolhimento multiprofissional garantiriam maior dignidade e eficiência no cuidado.
Argumento 2 – A insuficiência de políticas públicas e a impunidade diante da negligência
Causa:
Apesar da criação de programas como o Plano Nacional de Prevenção Primária (2021) e da aprovação de leis recentes, ainda há lacunas na regulamentação, fiscalização e investimento em saúde pública. Isso faz com que milhares de pacientes enfrentem barreiras para acessar serviços adequados.
Consequência:
A falta de medidas concretas e fiscalizações efetivas resulta em agravamento das doenças crônicas, altos índices de mortalidade precoce e desigualdades regionais no acesso à saúde. Além disso, a ausência de responsabilização diante da negligência institucional fortalece a sensação de abandono entre os pacientes e suas famílias.
Repertório que comprova:
A filósofa Hannah Arendt, ao discutir a “banalidade do mal”, afirma que a ausência de responsabilização diante de injustiças favorece sua normalização. No caso das doenças crônicas, a negligência estatal e a impunidade diante da falta de políticas eficazes tornam o sofrimento dos pacientes um fenômeno banalizado.
Solução possível:
É necessário fortalecer a atuação do Ministério da Saúde, ampliando investimentos em atenção primária e secundária, além de criar mecanismos de fiscalização mais rígidos para garantir que leis como a de 2025 sejam efetivamente aplicadas. Ademais, políticas de equidade regional poderiam reduzir desigualdades entre o Norte/Nordeste e outras regiões do Brasil.
Repertórios socioculturais sobre a invisibilidade social das doenças crônicas
📚 Quais livros ajudam a compreender as doenças crônicas e sua invisibilidade social?
- “A Doença como Metáfora” – Susan Sontag
A escritora norte-americana analisa como as doenças são envoltas em estigmas e metáforas sociais, reforçando preconceitos e dificultando a vida dos pacientes.
➡️ Relevante para discutir o estigma cultural ligado às doenças crônicas invisíveis. - “O Corpo em Dor” – Elaine Scarry
A filósofa explora como a experiência da dor é frequentemente invisível para a sociedade, pois não pode ser objetivamente comprovada.
➡️ Pertinente para abordar a dificuldade de reconhecimento social e institucional da fibromialgia e outras síndromes dolorosas. - “A Velhice” – Simone de Beauvoir
A filósofa francesa denuncia como a sociedade invisibiliza grupos considerados menos produtivos, como idosos e doentes crônicos.
➡️ Útil para relacionar a invisibilidade social com o preconceito etário e a marginalização no mercado de trabalho.
🎬 Quais filmes refletem sobre doenças crônicas e saúde pública?
- “Amor” (2012, Michael Haneke)
Mostra a trajetória de um casal idoso diante da progressão de uma doença degenerativa, revelando os desafios emocionais e sociais da condição crônica. - “O Óleo de Lorenzo” (1992)
Baseado em fatos reais, narra a luta dos pais por tratamento para uma rara doença neurológica do filho, evidenciando as falhas da medicina tradicional. - “Para Sempre Alice” (2014)
Retrata a evolução precoce do Alzheimer em uma professora, abordando tanto os impactos pessoais quanto sociais da doença.
➡️ Todos esses filmes ajudam a trazer humanidade para a discussão e a pensar em políticas públicas mais inclusivas.
⚖️ Quais legislações estão relacionadas às doenças crônicas no Brasil?
- Lei nº 13.798/2019 – Institui a Semana Nacional de Prevenção da Gravidez na Adolescência, mas abre precedentes para políticas de prevenção em saúde pública.
- Lei nº 14.737/2025 – Reconhece a fibromialgia e síndromes correlatas como deficiência em alguns contextos, garantindo atendimento multiprofissional pelo SUS.
- Política Nacional de Prevenção das DCNTs (2011) – Conjunto de ações intersetoriais que visam à redução de fatores de risco e ao acompanhamento integral dos pacientes.
➡️ Essas legislações podem ser usadas para mostrar avanços legais e apontar lacunas que ainda persistem.
🕰️ Qual fato histórico pode ser usado como repertório sobre doenças crônicas?
- Relatório da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS, 2024): mostrou que as doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) são responsáveis por 90% das mortes nas Américas.
➡️ É um dado histórico e atual que reforça a gravidade do problema em escala global.
Conclusão – como usar os repertórios na redação sobre doenças crônicas?
Ao inserir esses repertórios na redação, o estudante demonstra amplo repertório sociocultural, conecta sua argumentação à realidade brasileira e global, e ainda mostra domínio de leis, livros e dados históricos. Dessa forma, é possível construir uma introdução consistente, desenvolver argumentos com profundidade e propor soluções viáveis para o enfrentamento da invisibilidade das doenças crônicas.