O filme “Fuja”, original da Netflix e baseado em fatos reais, relata a história de uma mãe solteira que injeta medicações impróprias em sua filha para deixá-la sobre uma cadeira de rodas e, assim, controlar todos os seus passos. Adiante da ficção, a realidade apresentada na obra faz-se, também, presente no corpo social brasileiro vigente no que diz respeito ao relacionamento abusivo entre pais e filhos. Nesse sentido, em razão da sujeição opressiva aos pais e da pressão psicológica desenvolvida pelos filhos, nota-se a perpetuação de um grave embate social tratado como uma mera casualidade do século XXI.
Sob esse viés, cabe ressaltar que a coletividade como um todo compartilha de um pensamento equivocado de que filhos desrespeitam e desobedecem seus pais quando mostram-se autônomos e tomam decisões para seu próprio bem-estar. Segundo o sociólogo Émile Durkheim, o fato social é um modo coletivo de agir e de pensar dotado de exterioridade, generalidade e senso comum que, por vezes, retarda a evolução das relações sociais. Dessa forma, pais extremamente controladores geram indivíduos ausentes de raciocínio crítico, dependentes emocionalmente e à mercê de uma visão de mundo limitada e homogênea.
Outrossim, em virtude de pais que enxergam seus filhos como uma extensão de si mesmos e tentam moldar seus sonhos, percebe-se como uma grande massa social que carece de apoio familiar para alcançar seus objetivos se vê afetada pela questão da pressão psicológica e por uma culpa que não deveria existir. Nesse contexto, a medalhista nordestina de prata na modalidade skate street das Olimpíadas de Tóquio, Rayssa Leal, de apenas 13 anos, revelou que só conseguiu estar no pódio graças ao apoio de seus parentes. Logo, fica evidente o impacto positivo do suporte de pais para a consolidação da identidade e dos sonhos de seus filhos, bem como para a criação de um laço harmônico entre ambos.
Portanto, é mister que providências sejam tomadas para mitigar o quadro hodierno. Posto isso, urge que o Governo Federal, por meio de verbas públicas, invista em psicólogos no âmbito escolar que auxiliem crianças e jovens a como lidar da melhor forma com lares tóxicos, a fim de atenuar, desse modo, os frutos dos relacionamentos abusivos entre pais e filhos no país. Espera-se, com as medidas tomadas, que condutas como as demonstradas na trama “Fuja” estejam distantes da contemporaneidade brasileira.