TEMA: “CULTURA DO CANCELAMENTO: COMO REVERTER ESSA PRÁTICA NA CONTEMPORANEIDADE”
No seriado “Black Mirror”, disponível na plataforma de “streaming” Netflix, é narrado um universo utópico, no qual é possível, por meio da tecnologia, bloquear a existência de um indivíduo com base em sua opinião. Fora das telas, a cultura do cancelamento, semelhante ao enredo ficcional, promove impactos negativos na atual sociedade brasileira, em função, principalmente, da lógica punitivista e da influência sobre a vida das vítimas. Logo, é fundamental a ação conjunta entre os setores público e privado para dissolver tais costumes no hodierno corpo social.
Sob tal ótica, é importante destacar que o justiçamento colabora com a manutenção da problemática no cenário nacional. Isto é, a ideia de se deter o domínio sobre a justiça e de se possuir uma verdade absoluta auxilia na propagação de comportamentos violentos, sobretudo no âmbito digital, já que possui amplo alcance comunicativo e possibilita o anonimato dos agressores. Essa dinâmica pode ser relacionada à teoria da “Banalidade do Mal”, da filósofa alemã Hannah Arendt, na qual é apresentado que a fragilidade das atuais relações sociais naturaliza a disseminação de atitudes transgressoras, assim como o cancelamento. Nessa perspectiva, com a consolidação da “cultura canceladora”, ações como xingamentos em redes sociais e a divulgação de conteúdos que afetam as individualidades humanas tornam-se frequentes.
Ademais, vale ainda salientar que, na contemporaneidade brasileira, o cancelamento perde sua função educativa, na medida em que os cidadãos utilizam tal ferramenta para difundir ataques na comunidade, como ameaças de exibição de fotos íntimas. Com isso, o indivíduo penalizado, ao ter sua vida exposta, pode desenvolver distúrbios emocionais, como ansiedade e depressão, uma vez que perde a oportunidade de se defender e tem toda a sua trajetória reduzida à opinião de uma parcela social. A exemplo disso, a cantora Karol Conká perdeu milhares de seguidores, contratos de trabalho e desenvolveu psicopatologias após ser alvo de perseguições na internet, devido às suas falas xenofóbicas no programa televisivo “Big Brother Brasil”. Dessa forma, a busca informal por justiça prejudica a dignidade humana, ao passo que esta abandona sua atuação como agente modificador de irregularidades comunitárias.
Portanto, é essencial que o Ministério da Educação, órgão responsável pela promoção de atividades educativas, desenvolva projetos contra o cancelamento nas instituições de ensino, por meio de palestras e oficinas com professores, juízes e psicólogos, a fim de formar cidadãos conscientes quanto à importância do respeito. Além disso, é necessário que as empresas do ramo tecnológico criem um sistema de reconhecimento de publicações nocivas, mediante à eliminação imediata de conteúdos dotados de discursos de ódio, com o fito de tornar a internet um espaço mais seguro. Só assim, a utopia segregadora instaurada em “Black Mirror” será dissolvida e a sociedade brasileira caminhará, a médio prazo, em direção a um futuro desvinculado da cultura do cancelamento.