A Constituição da República, documento jurídico mais importante do país, prevê a igualdade de todos perante a lei. Entretanto, tal pressuposto não tem se refletido na prática, haja vista os persistentes desafios da mobilidade urbana no território nacional. Diante disso, faz-se inescusável a análise dos fatores que reforçam a problemática: o processo de formação das cidades brasileiras, em consonância com a ineficiência estatal.
Em uma primeira observação, devem-se ponderar as consequências da expansão desordenada das cidades. Nesse contexto, herdeira de um modelo rural, a maior parte da sociedade brasileira vivia no campo. No entanto, com o advento da industrialização do país, nas décadas de 1930 e 1940, houve um processo intenso de êxodo rural, levando ao crescimento desplanejado dos centros urbanos, de forma que os mais pobres passaram a ocupar as regiões mais afastadas e sem estrutura adequada. Assim, grande parte das cidades brasileiras constituíram-se de maneira que a mobilidade urbana torna-se um grande desafio para seus habitantes, principalmente para os mais afetados pelas desigualdades sociais.
Ademais, é preponderante apontar a incapacidade do estado para elaborar uma estratégia de conflito eficaz. Nesse âmbito, à guisa do pensamento do filósofo Aristóteles, a política deve ser feita de forma que, por intermédio da justiça, o equilíbrio seja alcançado. Contudo, na contramão desse ideal estão as instituições estatais brasileiras que, mesmo com a legislação estipulando a necessidade de um plano de mobilidade urbana, apenas 6% das cidades contam com um. Evidencia-se, dessarte, um nefasto cenário, em que a Constituição de 1988 não vem sendo aplicada de fato, acarretando em um desigual, desordenado e ineficiente espaço urbano, pois sem oferecer condições dignas de movimentação o desenvolvimento humano e econômico fica comprometido.
Depreende-se, portanto, a imprescindibilidade de se combater esses obstáculos. Para isso, é dever do Estado, por meio do Poder Judiciário, a fiscalização mais efetiva do cumprimento das leis de mobilidade, a fim reduzir, paulatinamente, o caótico cenário de mobilidade das cidades brasileiras e garantir a democratização do acesso a todos os espaços. Paralelo a isso, é função do Poder Legislativo debater e criar leis de incentivo fiscal para o financiamento dos custos de transporte público para os cidadãos de baixa renda. Por conseguinte, o corpo civil do Brasil estará mais afastado da segregação socioespacial, sendo assim, mais próximo do equilíbrio aristotélico.