Na obra "O Espírito das Leis", Montesquieu enfatizou que é preciso analisar as relações sociais existentes em um povo para aplicar as diretrizes legais e abonar o progresso coletivo. No entanto, ao observar o abandono paterno no Brasil, certifica-se que a teoria do filósofo diverge da realidade contemporânea, haja vista a persistência do machismo na sociedade, fato que impede a ascensão do Estado brasileiro. Com efeito, é imprescindível enunciar os aspectos socioculturais e a insuficiência legislativa como pilares fundamentais da chaga.
É importante considerar, antes de tudo, o fator grupal, pois, segundo Jurgen Habermas, a razão comunicativa - ou seja, o diálogo - constitui etapa fundamental do desenvolvimento social. Nesse ínterim, a falta de estímulo ao debate a respeito do tema aqui proposto coíbe o poder transformador da deliberação e, consequentemente, faz crescer o número de pais que não se sentem na obrigação de criar ou assumir os seus filhos. Assim, segundo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mais de 80 mil crianças não possuem o nome do pai na certidão de nascimento. Esse fato ocorre porque historicamente, em uma cultura machista, os homens foram dispensados das funções de educar e criar seus filhos, sendo essa tarefa atribuída apenas à mulher. Dessarte, discorrer criticamente a problemática é o primeiro passo para a consolidação do progresso habermaseano.
Além disso, merece destaque o quesito constitucional. Logo, segundo Jean-Jacques Rousseau, os cidadãos cedem parte da liberdade adquirida na circunstância natural para que o Estado garanta direitos intransigentes. Por isso, o abandono paternal contrasta a concepção do pensador, na medida em que, também segundo o IBGE, apenas uma pequena parcela desses pais são encontrados pela justiça e obrigados por lei a prestarem algum tipo de auxílio para a criança. Ou seja, o poder público ainda não é eficiente no que tange a garantir o direito da criança a ter os pais presentes. Dessa forma, ações precisam ser executadas pelas autoridades, com o fito de dirimir o revés.
Portanto, entende-se a temática como sendo um obstáculo intrínseco de raízes culturais e legislativas. Em virtude disso, a mídia, por intermédio de programas televisivos de grande audiência, deve discutir o assunto com advogados especialistas em direito da família, da criança e do adolescente, com o objetivo de orientá-los sobre seus direitos e deveres constitucionais e como eles podem ser exercidos. Em paralelo, deve-se ampliar os debates acerca da desconstrução do machismo e do patriarcado, para que os homens entendam melhor as suas reais funções dentro de uma sociedade. Essas medidas ocorrerão por meio da elaboração de um projeto estatal em parceria com o Ministério das Comunicações. Só assim será possível garantir o progresso social concretizado, como enfatizou Montesquieu.