De acordo com o filósofo Ailton Krenak, havia uma crença do povo Guarani do século XVI, a qual consistia na busca da “Terra sem males”, que se caracterizaria pela ausência de adversidades e problemas. Contrapondo-se à mitologia dos povos aborígenes brasileiros, o que se observa na contemporaneidade é um grave déficit habitacional no Brasil, o qual se deve a conjunturas históricas e que foi massivamente acentuado a partir da pandemia da COVID-19. Desse modo, é essencial que o debate acerca da problemática ocorra, a fim de atingir o pleno funcionamento da coletividade.
Em primeiro plano, é legítimo postular que o impasse do déficit de moradia é resultado de questões advindas de séculos anteriores ao hodierno. Nesse sentido, o prefeito da cidade do Rio de Janeiro, Pereira Passos, no início do século XX, decidiu realizar reformas na então capital da recente República; e, para tal, expulsou a população pobre da região central, o que a fez ocupar áreas periféricas, as quais não apresentavam condições necessárias à vida humana. A partir do exposto, analisa-se que a mácula discutida, datada de anos, fere, erroneamente, um direito social garantido na Constituição Federal de 1988, o qual se faz inalienável na medida em que pressupõe a capacidade de o indivíduo poder realizar seus anseios pessoais, como obter notoriedade em sua carreira laboral.
Em segundo plano, destaca-se a lamentável contribuição da pandemia do Coronavírus para o problema supracitado. Sob esse viés, durante a proliferação da doença, a estrutura econômica brasileira foi amplamente afetada, haja vista que o contingente de indivíduos desempregados atingiu 14 milhões, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o que fez milhares de famílias perderem sua renda e possuírem apenas o auxílio emergencial federal (R$600,00 e, posteriormente, R$300,00) como tal. Por conseguinte, um alto número de pessoas passou, infelizmente, a não ter a possibilidade de proporcionar uma moradia decente a seus familiares. Destarte, é imperioso que novas medidas sejam adotadas pelos mediadores da ordem social, além da ajuda financeira do Estado, a qual se encerrou junto ao ano de 2020, para acabar com o presente impasse, responsável por afligir os cidadãos brasileiros.
Portanto, urge que ações sejam executadas, para fazer com que o déficit habitacional seja drasticamente atenuado. Para tanto, é premente que a União, os estados e os municípios promovam, por meio de parte do seu orçamento anual, apoio financeiro e incentivo profissional às famílias gravemente afetadas por tal deficiência, a fim de possibilitar a elas a aquisição de um satisfatório local para ser ocupado. Outrossim, é mister que os mesmos agentes, por intermédio de discussões, direcionem uma maior quantia de recursos para programas habitacionais, como o Casa Verde e Amarela, do governo federal, visando à diminuição do infeliz quadro conjuntural observado. Somente assim, gradativamente, o corpo social estará mais próximo da “Terra sem males”, proposta pelo povo Guarani.