Caminhos para o combate à evasão escolar
Na obra graciliana “Vidas Secas”, o sertanejo Fabiano descreve ao longo da narrativa a sua percepção de inferioridade diante do contato com indivíduos letrados, o que expõe ao leitor que o analfabetismo enfrentado pelo personagem ratifica a compactuação diante da sua privação de direitos e o não reconhecimento de seu ser enquanto indivíduo social. Similarmente, na atual conjuntura brasileira, apesar do acesso à educação ser preconizado como um direito inalienável do cidadão, por meio da Constituição Federal Brasileira de 1988, a sistêmica desigualdade social vulnerabiliza as camadas carentes da população e fomenta altos índices de evasão escolar-fato que se configura como um retrocesso. Esse cenário tem como causa a manutenção do histórico cultural e resulta em um tipo de estratificação do capital cultural, tal qual representada pela literatura.
Em primeiro plano, no Período Colonial, a fim de que as minorias economicamente vulneráveis mantivessem o desconhecimento de sua condição opressora, a restrição de uma educação democrática caracterizou-se como política segregacionista. Paralelo a isso, percebe-se que, na contemporaneidade, as diminutas medidas de equiparação do Estado acerca das disparidades socioeconômicas induzem os jovens a, precocemente, substituírem os livros e a educação pelo trabalho de subsistência. De acordo com dados do IBGE, em apenas 4 anos, cerca de 1,3 milhão de discentes evadiram das escolas, sobretudo, das instituições públicas. Como consequência, a restrição do saber e o não reconhecimento de sua importância por substancial parcela social fomenta trabalhos com baixa remuneração e, em casos extremos, o trabalho análogo à escravidão, o que vai de encontro à realidade de Fabiano.
Outrossim, em um contexto de pandemia, no qual o ensino presencial tradicionalista perdeu voz, a não democratização do acesso à internet constitui um preocupante agente no aprofundamento da evasão escolar brasileira. Sob esse viés, com o auxílio das Tecnologias de Informação e Comunicação, as aulas passaram a ser virtuais e isso é uma barreira para os jovens de periferia que não possuem o contato com a internet. Como exemplo, a série documental “Freenet” discorre a triste realidade da comunidade ribeirinha São Francisco do Caramuri, AM, a qual, em razão das dificuldades do acesso à internet e, consequentemente, aos materiais didáticos, muitas crianças e adolescentes abandonam a esperança do ensino igualitário. Logo, o “Capital Cultural”, tese elaborada pelo filósofo Francês Pierre Bordieu, que consiste no acúmulo de conhecimento de determinada comunidade, passa a ser privilégio de poucos- o que relembra o Brasil Colônia.
Registram-se, portanto, obstáculos nos caminhos para o combate à evasão escolar brasileira. Diante disso, é dever do Estado, enquanto poder público, a inserção da reestruturação pedagógica educacional como prioridade na Lei de Diretrizes Orçamentárias, a qual deve garantir substancial aumento dos subsídios educacionais. Desse modo, será viável que o Ministério da Educação promova um projeto mais amplo acerca da evasão escolar, a fim de coibi-la. Dentro deste, deve haver a disponibilização de “netbooks”, microcomputadores, para os alunos carentes que necessitam do acesso à internet, bem como o incremento de incentivos fiscais para empresas que disponibilizam o serviço banda larga, de modo a tornar acessível e democrática a internet em todo território nacional. Ademais, é de suma importância a reformulação pedagógica do ensino tradicionalista, de maneira que contenha um acompanhamento horizontal do aluno e que salvaguarde o aparato para alunos carentes, em paralelo com o fomento de brincadeiras lúdicas que despertem o interesse dos discentes. Apesar de simples, tais medidas caminharão rumo à democratização da educação e, felizmente, mais “fabianos” relegarão de suas condições opressoras.