a desertificação dos espaços públicos no brasil
o artigo 182 da constituição federal de 1988 afirma que a política de desenvolvimento urbano tem por objetivo ordenar a plena promoção e otimização das funções sociais das cidades. no entanto, no cenário contemporâneo, o crescente fenômeno da desertificação do espaço público brasileiro figura como um obstáculo à efetivação do que é proposto pela lei. esse cenário é reflexo da negligência governamental no que tange à questão da violência nos grandes centros e tem como consequência a fragilização das relações coletivas.
a princípio, é fundamental ressaltar que a forte violência urbana é um dos principais fomentadores da problemática. nesse sentido, o sentimento de insegurança constante e o medo passam a exercer domínio sobre a vida dos cidadãos, que, em alternativa a essa realidade, buscam o isolamento em lugares que oferecem serviços e proteção conjuntamente - a exemplo de condomínios residenciais detentores de academias, quadras, espaço “gourmet”, ao mesmo tempo que apresentam câmeras de segurança, muros e cercas elétricas. essa realidade, segundo o sociólogo polônes zygmunt bauman, constitui a chamada “arquitetura do medo”, na qual espaços coletivos, como praças, perdem significação quanto lugares de convívio social e passam por um esvaziamento. nota-se, portanto, as rupturas espaciais geradas por um processo que deveria ser combatido veementemente no brasil.
por conseguinte, essa conjuntura favorece o distanciamento entre os citadinos, intensificando a exclusão social e o enfraquecimento de laços identitários. dentro dessa perspectiva, parte da população, sem capital suficiente, se encontra segregada da parcela detentora de recursos financeiros que se aparta por meio meio dos enclaves fortificados - locais fechados para moradia, lazer ou consumo -, o que dificulta a construção de relações coletivas. conforme a filósofa alemã hannah arendt, entretanto, o espaço público é o lócus de atuação do corpo social, onde ocorre o pleno exercício da cidadania pela interconexão de pessoas. assim, tais lugares são primordiais para convivência e para o desenvolvimento de atividades humanas, tornando-se elementos imprescindíveis na construção dos vínculos identitários.
em suma, o impasse de ordem social modifica não só características físicas da localidade, mas também as relações construídas nela. logo, para que a política de desenvolvimento urbano - garantida constitucionalmente - seja plenamente exercida, cabe ao poder municipal de cada lugar instigar o uso de seus espaços públicos. isso deve ser feito por meio da construção de praças, quadras e academias coletivas, bem como mediante investimentos no policiamento dessas áreas. dessa forma, os citadinos poderão aproveitá-las de modo eficiente e conseguirão interagir entre si de maneira mais inclusiva, concretizando o exercício da cidadania, como defendia a filósofa h. arendt.