os impactos da propaganda no brasil contemporâneo]
a era da "pós-verdade"
as estratégias de propaganda sempre foram determinadas pelas capacidades das tecnologias de comunicação de massa, cuja "pré-história" remete à invenção dos tipos móveis de imprensa por j. gutenberg no século xv, e sempre causaram um forte impacto social. em contraste com o jornal, o rádio e a televisão, as recentes tecnologias de comunicação, como a internet e "smartphones", típicas do século xxi, têm permitido, pela primeira vez, devido a enorme capilaridade e interatividade, que o consumidor deixe de ser um mero receptor passivo para tornar-se também um potencial propagador e remixador da mensagem propagandista. contudo, teriam essa nova perspectiva e potencial tecnológico permitido uma diminuição dos efeitos da alienação, própria da cultura de massa em que estamos inseridos?
primeiramente, é importante considerar as forças sociais e ideológicas que regem a contemporaneidade. segundo zygmunt bauman, nossa sociedade é configurada por aquilo que definiu como "sociedade líquida". nesta, dentre outras coisas, as relações humanas são caracterizadas pela superficialidade e por seguirem as leis do mercado. em outras palavras, por esse prisma, cada relação, vivida com os olhos voltados para fora e não para dentro, é tida mais como uma ameaça a todas as outras possíveis relações disponíveis do que como uma possibilidade de viver, de fato, uma experiência íntima e completa. tal individualismo leva a um enfraquecimento da empatia e, consequentemente, a uma crise ética, já que há pouco interesse pela compreensão do outro.
nesse contexto social, é compreensível que as novas estratégias de propaganda não tenham aproveitado o potencial das recentes tecnologias de comunicação para diminuir a alienação, esclarecer ou unir, mas para aumentar, ainda mais, a superficialidade, a desinformação e a polarização. vivemos a era da "pós-verdade", eleita a palavra do ano de 2016 pelo dicionário oxford ("post-truth"), na qual a enorme capacidade de propagação de boatos tem transformado-os rapidamente em "bolhas ideológicas" cristalizadas com valor de verdade no imaginário social. desse modo, as "fake news", utilizadas como estratégia de propaganda política, têm, mais que nunca, decidido eleições em todo o mundo, incluindo o brasil. além disso, a recente possibilidade de cada pessoa possuir seu próprio canal, tornar-se veículo, um "influenciador", e viver de propaganda tem transformado as amizades, literalmente, num "mercado de 'likes'" e, dessa maneira, transferindo ainda mais o foco para a quantidade e superficialidade ao invés da qualidade e intimidade das relações interpessoais. o brasil é um dos países do mundo mais assíduos nas redes sociais e, portanto, um lugar onde esse fenômeno tornou-se uma febre.
por fim, para mudar essa situação, é imprescindível que a sociedade, as famílias e as escolas debatam, tanto nas salas de aula, no contato íntimo do dia a dia como também nas próprias redes sociais, temas filosóficos com a mesma importância que debatem temas técnicos/tecnológicos e do entretenimento. o ministério da educação deve estender o ensino de filosofia e sociologia, mesmo que de uma maneira mais lúdica, ao ensino fundamental bem como cobrar com mais intensidade tais disciplinas nos diversos exames e concursos públicos. tudo isso a fim de minimizar a crise ética ou, como especifica o próprio bauman, a fim de estimular o senso crítico dos jovens e fortalecer, nas palavras dele, as "utopias iconoclastas", neste caso, uma ideia capaz de unir a sociedade em prol de um objetivo e do bem comum. afinal, de pouco adianta os grandes avanços tecnológicos se os valores éticos que determinam a qualidade de seu uso também não forem desenvolvidos.